Tempo de leitura: 6 minutos
O Plano Individual de Atendimento (PIA), exigido no atendimento à crianças e adolescentes desde o Estatuto da Criança e do Adolescente, ganhou, em abril de 2018, uma padronização do MDS. Neste texto, Jader Lopes, assistente social há 10 anos e que viveu na pele o atendimento a menores em serviços de acolhimento, escreve sobre a importância desse instrumento.
Enquanto profissional do Serviço Social, tive a oportunidade de trabalhar com crianças e adolescentes afastados da família por medida de proteção. Estas medidas propõem uma segurança mínima de acolhimento e afastamento de alguma violência sofrida, seja um abandono, negligência de cuidados, abuso sexual, violências físicas ou outras de suas formas. Esta é uma realidade dura, mas existe.
Como forma de enfrentamento à este tipo de violência, a Política Nacional de Assistência Social estrutura serviços socioassistenciais de acolhimento à estas situações. São os serviços da Proteção Social Especial.
Se aprofunde: Proteção Social Especial e Conselho Tutelar: parceria estratégica
O Serviço de Acolhimento Institucional é garantido dentro da Proteção Social Especial de Alta Complexidade objetivando acolher famílias e/ou indivíduos cujos vínculos familiares foram rompidos, ofertando a estes proteção integral. Neste serviço são desenvolvidos trabalhos técnicos, planejamentos, estudos sociais e situacionais, bem como acompanhamento familiar para a superação da violência, possibilidade de reintegração familiar, minimização dos impactos sofridos e desenvolvimento da autonomia dos acolhidos.
Este acompanhamento especializado exige uma instrumentalização adequada, a qual é chamada de Plano Individual de Atendimento e exigida pelo Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA), Lei nº 8.069, de 13 de julho de 1990, atualizado pela Lei nº 12.010, de 3 de agosto de 2009, e, também, na Resolução Conjunta CNAS/ CONANDA nº 01/2009.
O Plano Individual de Atendimento (PIA)
Um dos maiores desafios que vivenciei em uma unidade de acolhimento institucional para crianças e adolescente estava no planejamento de ações de promoção à proteção social, reintegração familiar e desenvolvimento da autonomia destes acolhidos. Tal planejamento deve considerar a análise de contextos individuais, comunidade, relações sociofamiliares, entre outras questões que precisam impactar nas decisões de direcionamento de atendimentos e pactuações com a família.
A construção de um PIA se mostrava, então, prioritária para a qualidade e efetividade nas intervenções. Mas como se processa a criação deste plano? Quais os campos a se investigar? Como investigar? Sempre foram inquietações que causavam uma falta de padronização deste instrumento e até mesmo o investimento em assuntos não relevantes para o serviço.
Em Abril de 2018, o Ministério do Desenvolvimento Social, por meio da Secretaria Nacional de Assistência Social, lançou as Orientações Técnicas para Elaboração do Plano individual de Acompanhamento (PIA) de Crianças e Adolescentes em Serviços de Acolhimento.
Sobre sua elaboração, vemos no texto do documento que:
“(…), a partir de 2013 até novembro de 2014, foi realizado um levantamento de modelos de PIA já utilizados em algumas localidades do país e elaborada uma primeira proposta pelo MDS, discutida em uma oficina técnica que contou com a participação de especialistas convidados, além de representantes da Comissão Nacional Intersetorial da Convivência Familiar e Comunitária, participaram, ainda, representantes do FONSEAS, CONGEMAS, CONANDA e CNAS. Esta oficina subsidiou a elaboração da versão disponibilizada para Consulta Pública realizada em abril de 2017.”
Esta articulação para elaboração de um modelo padrão de PIA considerou as especificidades de cada ator inserido no contexto deste tipo de acompanhamento bem como as experiências das equipes técnicas de Unidades de Acolhimento. Surge assim um instrumento fundamentado, qualificado e produto de experiências que pode fortalecer o serviço a ele inerente.
Importância da padronização
Pronto, temos então uma referência a nível nacional de, talvez, o instrumento de trabalho mais importante dentro do Serviço de Acolhimento Institucional, uma vez que este concentra o resultado dos diagnósticos e as avaliações da equipe, as estratégias de prioridades de ação e, também, as pactuações e acordos firmados entre serviço e família/acolhido. Mas em que isso impacta?
Temos que ter em mente que uma grande parte do trabalho da equipe só pode ocorrer com efetividade se esta tiver um foco coerente e um planejamento adequado à execução do serviço no intuito do alcance de seus objetivos. Ao oferecer um padrão de PIA, a SNAS oferece a possibilidade de potencializar a intervenção técnica e oferece o alinhamento construído com os diversos atores do Sistema de Garantida de Direitos.
Esta produção conjunta é entregue às equipes técnicas como a linguagem pactuada entre profissionais de diversas áreas que atuam diretamente no acompanhamento de situações de acolhimento institucional, dando assim um conteúdo substancial para suas ações.
Para além disto, uma padronização de instrumentos permite uma ampliação da vigilância socioassistencial nesta área e a criação de novos indicadores de monitoramento, incidindo diretamente na qualificação dos serviços e na sua adequação a realidade estudada. Conhecer para agir deve ser o movimento da Política de Assistência Social.
Caminhos e construções possíveis com o PIA
Como visto acima, uma das possibilidades emergidas com a padronização do PIA é a ampliação do conhecimento sobre a situação de Acolhimento Institucional em todo o território nacional. Isto é possível pois neste cenário já há terreno para coleta de dados, análise de informações e produção de conhecimento.
A perspectiva de uma construção pautada na realidade mensurada é função da política de Assistência Social, denominada de Vigilância Socioassistencial. Esta função está presente em todos os níveis de proteção, processos de trabalho, serviços, programas, projetos e benefícios desta política, uma vez que todos eles integram o escopo da PNAS.
Veja também: todos os textos do blog sobre a Vigilância Socioassistencial
Conclusão
Estamos num momento muito importante da Política de Assistência Social, a qual tem crescido e se apresentado com maior clareza e assumido seu caráter e identidade no território brasileiro, trazendo uma uniformidade na oferta de serviços e fortalecendo sua base de atuação ao implementar mecanismos de monitoramento das situações de risco e vulnerabilidade social presentes no território.
A utilização do Plano Individual de Atendimento indicada no documento da SNAS pelas equipes dos acolhimentos institucionais apresenta em si um fortalecimento da PNAS e sua caminhada para consolidar um trabalho social de apoio sociofamiliar a crianças e adolescentes, bem como suas famílias, para minimizar os impactos sofridos em decorrência de violência vivida por estes.
Leia mais
- Proteção Social Especial no Gesuas
- Serviço de Acolhimento em Família Acolhedora
- Lei da Escuta Protegida: aspectos da Lei e procedimentos de atendimento no âmbito do SUAS
Referência Bibliográficas
- BRASIL. Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais. 2014.
- Resolução CNAS 109/2014 e Resolução CNAS 13/2014.
- BRASIL. Estatuto da Criança e do Adolescente.
- BRASIL. Orientações Técnicas: Serviços de Acolhimento para Crianças e Adolescentes. 2009
- BRASIL. Orientações Técnicas para Elaboração do Plano Individual de Atendimento (PIA) de Crianças e Adolescentes em Serviços de Acolhimento. 2018