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De acordo com a Constituição Federal de 1988, todas as ações governamentais na área da assistência social devem ser realizadas com recursos do orçamento da seguridade social conforme previsto no art. 195, além de outras fontes previstas no art. 204.
É neste contexto que funciona o Sistema Único de Assistência Social (SUAS), sistema público que organiza de forma descentralizada os serviços socioassistenciais no Brasil. Possui um modelo de gestão participativa, que permite a captação de recursos nas três esferas de governo para a execução e o financiamento da Política Nacional de Assistência Social (PNAS).
As políticas sociais devem ser financiadas mediante recursos provenientes dos orçamentos da União, do Distrito Federal, dos estados e municípios e das diversas contribuições sociais.
Uma das ferramentas mais utilizadas para garantir o funcionamento e manutenção dos serviços socioassistenciais é o cofinanciamento da assistência social. E conhecer sua importância para o desenvolvimento e expansão da rede de atendimento é o nosso tema de hoje.
Cofinanciamento
Os recursos do cofinanciamento para a execução da assistência social são alocados no Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS). Todavia, os recursos dos estados e municípios, são alocados, respectivamente, nos Fundos Estaduais e Municipais de Assistência Social, constituídos como unidades orçamentárias, e do Distrito Federal, no Fundo de Assistência Social do Distrito Federal.
De acordo com a NOB SUAS/2012 que ratifica o art. 30 da Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS (Lei nº 8.742/1993), para que os Estados, o Distrito Federal e os Municípios recebam os recursos referentes ao cofinanciamento federal, têm-se como requisitos mínimos:
- A existência do Conselho de Assistência Social instituído e em funcionamento;
- O Plano de Assistência Social elaborado e aprovado pelo Conselho de Assistência Social;
- O Fundo de Assistência Social criado em lei e implantado.
O Fundo Público é um importante instrumento para o desenvolvimento das relações de produção capitalistas, cujos recursos são disputados no âmbito do orçamento público, garantindo assim uma ação planejada pelo Estado de forma a assegurar prioritariamente o financiamento das políticas sociais.
A Consolidação dos Fundos Públicos como Estruturas de Redistribuição de Renda
Os Fundos Públicos consolidaram-se como uma nova estrutura para a redistribuição de renda, sobrepondo a estrutura já existente, constituída pela dinâmica capitalista, reforçando assim o financiamento do orçamento público no Brasil pelos mais pobres, através de impostos sobre o salário e tributos indiretos, o que caracteriza uma elevada concentração de renda e desigualdades sociais devido ao caráter regressivo da carga tributária, apropriada pelos mais ricos através da acumulação de capital e transferência de recursos para o mercado financeiro.
Nota-se, que a correlação de forças sociais é um elemento determinante para a consolidação dos direitos sociais mediante a compreensão da apropriação dos recursos do orçamento público para a composição do fundo público. Este por sua vez, ocupa um importante papel na articulação das políticas sociais e na sua relação na reprodução da força de trabalho e gastos sociais, sendo considerado questão estrutural do capitalismo.
Fundos de Assistência Social
Os fundos da assistência social estão classificados como Fundos Especiais de Despesa, ou seja, são contas próprias, mantidas por uma unidade administrativa (órgão), com condições de execução orçamentária e financeira, e de arrecadação de receitas, cujas despesas estejam obrigatoriamente relacionadas às suas atividades.
Os Fundos Especiais de Despesa são criados por força da lei, conforme estabelecido na Constituição Federal de 1988, entretanto, ainda necessitam de uma lei complementar para estipular condições de instituição e funcionamento. Surgiram com a finalidade de flexibilizar a operação das atividades da Administração Direta, de modo a promover a desconcentração das atividades orçamentárias, facilitando assim, a administração dos recursos públicos para uma determinada finalidade específica.
É importante ressaltar que os Fundos Especiais de Despesa estão submetidos às regras do Sistema Orçamentário Brasileiro, devendo a lei orçamentária prever suas receitas e suas despesas.
Sistema orçamentário brasileiro
No Brasil, os recursos do orçamento público federal estão expressos na Lei Orçamentária Anual (LOA), no Plano Plurianual (PPA) e na Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO), materializando assim o planejamento e a execução das políticas públicas em cada ente da Federação (União, Estados, Municípios e Distrito Federal).
Desde a Constituição Federal de 1988, buscava-se meios para legitimar um sistema orçamentário integrado para a elaboração do orçamento público, o que somente ocorreu com a Lei Complementar nº 101, de 4 de maio de 2000, a chamada Lei de Responsabilidade Fiscal, que estabelece normas de finanças públicas voltadas para a responsabilidade na gestão fiscal.
A Lei de Responsabilidade Fiscal ratificou essa integração, ao mesmo tempo que reforçava a necessidade de acompanhamento da execução orçamentária, como meio de monitorar o processo de planejamento.
Para tanto, o orçamento foi dividido em três normativas fundamentais, que veremos a seguir:
Plano Plurianual (PPA)
Previsto no art. 165 da Constituição Federal de 1988 e regulamentado pelo Decreto nº 2.829, de 29 de outubro de 1998, o Plano Plurianual (PPA), estabelece as medidas, gastos e objetivos a serem seguidos pela administração ao longo de um período de quatro anos.
Uma vez definidas as ações governamentais no PPA, estas são concretizadas na Lei Orçamentária Anual (LOA), através de programas de trabalho específicos, formulados pelos diversos órgãos que compõem a administração pública, proporcionando assim, meios para que os objetivos e metas propostas sejam atingidos. Dentre esses programas de trabalho específicos,estão o cofinanciamento dos serviços de caráter continuado e de programas da assistência social, como por exemplo, o Serviço de Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF) e o Programa Bolsa Família.
Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO)
Descrita no art. 165, parágrafo 2º da Constituição Federal de 1988, a LDO tem por finalidade a orientação e elaboração dos orçamentos fiscais e da seguridade social e de investimentos das empresas estatais, além de promover a integração da LOA, com as diretrizes, objetivos e metas estabelecidos no PPA, conforme os princípios do sistema orçamentário. Deve ser elaborada anualmente pela Administração e aprovada pelo Poder Legislativo, que após aprovação remeterá ao Executivo para sanção.
Conforme a Constituição Federal de 1988, a LDO deverá conter as metas e prioridades da administração pública para o exercício financeiro subsequente (despesas de capital), orientações para elaboração da LOA, normas sobre as alterações na legislação tributária, e as diretrizes para estabelecer a política de aplicação das agências financeiras oficiais de fomento.
Lei Orçamentária Anual (LOA)
A Lei Orçamentária Anual (LOA) ou orçamento anual, é uma lei elaborada pelo Poder Executivo para a concretização dos objetivos e metas propostas no PPA, de acordo com as diretrizes estabelecidas pela LDO e em conformidade com os princípios do orçamento público.
Conforme determina a Constituição Federal, deve ser votado e aprovado até o final de cada Legislatura, ficando a cargo do Chefe do Poder Executivo, o envio da proposta orçamentária ao órgão legislativo para apreciação.
O processo de funcionamento da Lei Orçamentária Anual (LOA), da Lei de Diretrizes Orçamentárias (LDO) e do Plano Plurianual (PPA), devem respeitar estritamente os princípios constitucionais orçamentários, bem como os que regem a Administração Pública, dentre eles, a moralidade, publicidade e a eficiência, garantindo assim o interesse público.
É neste âmbito que o orçamento da assistência social é estabelecido, seguindo-se as normativas do Sistema Orçamentário Brasileiro. É importante ressaltar que os recursos devem ser incluídos nos respectivos orçamentos dos Fundos, como prevê a NOB/SUAS, a Lei 4.320 de 1964 e as demais legislações complementares pertinentes.
Repasse dos recursos alocados no FNAS
É através de um sistema informatizado chamado SUASWeb, que a Secretaria Nacional de Assistência Social (SNAS) garante o repasse regular e automático dos recursos do cofinanciamento federal dos serviços socioassistenciais do Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) para os Fundos de Assistência Social dos Estados, Distrito Federal e Municípios.
Vejamos quais são os passos para recebimentos dos recursos alocados no FNAS:
1⁰ passo
Para transferência dos recursos alocados no FNAS, é realizado o lançamento da previsão financeira do repasse do cofinanciamento federal pela Secretaria Nacional de Assistência Social após partilha dos recursos federais pactuada pela Comissão Intergestores Tripartide (CIT).
2⁰ passo
Com o recebimento do Plano de Ação encaminhado pelos Estados, Municípios e Distrito Federal, que deverão estar em consonância com o Plano de Assistência Social, o FNAS realiza a transferência dos recursos através da modalidade fundo a fundo, diretamente aos Fundos Estaduais, do Distrito Federal e Municipais de Assistência Social.
3⁰ passo
A transferência de recursos do cofinanciamento federal é finalizada com a abertura de contas correntes pelo FNAS em nome da Prefeitura Municipal direcionada ao FMAS, e deve corresponder a cada Piso de Proteção Social.
- O Piso de Proteção Social são valores de cofinanciamento federal, transferidos pelo FNAS, e que tem por objetivo complementar os financiamentos estaduais, municipais e do Distrito Federal, destinados ao custeio dos serviços e ações de prestação continuada, variando conforme o nível de complexidade.
Os recursos transferidos pelo FNAS contribuem para a continuidade dos serviços ofertados pelos CREAS e Centro POP, como o Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias e Indivíduos (PAEFI) e o Serviço Especializado para Pessoas em Situação de Rua.
Transferência entre fundos
Importante instrumento para a gestão das políticas sociais, os Fundos Públicos expressam questões prioritárias acerca da política, pois destacam o que é prioritário dentro dos planos propostos pelo governo e se estes estão sendo concretizados ou não.
De acordo com o TCU (2013), “a transferência de recursos do Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) aos fundos Estaduais, Municipais e do Distrito Federal são aplicados conforme as prioridades definidas nos planos de assistência social aprovados pelos respectivos Conselhos. Os recursos devem ser aplicados na operacionalização, prestação, aprimoramento e viabilização dos serviços, programas, projetos e benefícios desta política”.
Uma vez aplicados os recursos, deve-se realizar a prestação de contas da utilização dos recursos federais transferidos, sendo que Estados, Municípios e Distrito Federal devem prestar contas dos recursos do cofinanciamento federal dos serviços socioassistenciais, por meio do Demonstrativo Sintético Anual de Execução Físico-Financeira, disponibilizado no sistema SUASWeb.
Como é realizada a Gestão dos Fundos da Assistência Social?
Em relação ao cofinanciamento da Política de Assistência Social, os fundos são o lócus privilegiado para a gestão do financiamento das políticas públicas nas três esferas de governo, cabendo aos Conselhos de Assistência Social o papel de orientação, controle e fiscalização dos fundos, sem desconsiderar que tal prerrogativa deve estar em consonância com os princípios democráticos de participação, transparência, descentralização político-administrativa e controle social.
Os recursos transferidos pelo Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) aos Fundos Estaduais, Municipais e do Distrito Federal devem ser aplicados conforme prioridades definidas nos Planos de Assistência Social aprovados pelos Conselhos.
Cabe ao gestor, o planejamento orçamentário e administrativo do órgão que possui um Fundo Especial de Despesa. Dentre as competências necessárias que o gestor deve possuir para planejar e administrar os recursos proveniente dos Fundos Especiais de Despesa estão:
- Profundo conhecimento do funcionamento de sua unidade, englobando todas as suas carências e necessidades;
- Planejamento do escopo do desenho contendo os objetivos a serem executados;
- Conhecimento do histórico de arrecadação de receitas do Fundo Especial de Despesa; e
- Planejamento da realização de despesas na unidade.
Como vimos, gestor o deve possuir capacidade técnica para planejar e administrar o orçamento, tendo em vista a obrigatoriedade da prestação de contas dos recursos aplicados.
O Financiamento das políticas públicas
A PNAS situa a Assistência Social como Proteção Social não contributiva, apontando para a realização de ações direcionadas para proteger os cidadãos contra riscos sociais inerentes aos ciclos de vida e para o atendimento de necessidades individuais ou sociais, apresentada em dois níveis de atenção: Proteção Social Básica e Proteção Social Especial (de alta e média complexidade).
Os recursos repassados pelo Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) destinam-se ao:
- Cofinanciamento dos serviços de caráter continuado e de programas e projetos de assistência social, destinado ao custeio de ações e ao investimento em equipamentos públicos da rede socioassistencial dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
- Cofinanciamento da estruturação da rede socioassistencial dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, incluindo ampliação e construção de equipamentos públicos, para aprimorar a capacidade instalada e fortalecer o Sistema Único da Assistência Social – SUAS;
- Atendimento, em conjunto com os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, às ações assistenciais de caráter de emergência;
- Aprimoramento da gestão de serviços, programas, projetos e benefícios de assistência social, por meio do IGD do SUAS, para a utilização no âmbito dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios;
- Apoio financeiro às ações de gestão e execução descentralizada do Programa Bolsa Família pelos Estados, pelo Distrito Federal e pelos Municípios, por meio do IGD/PBF;
- Pagamento, operacionalização, gestão, informatização, pesquisa, monitoramento e avaliação do benefício de prestação continuada e de renda mensal vitalícia; e
- Atendimento das despesas de operacionalização que visem implementar ações de assistência social.
O cofinanciamento inclui ainda o repasse de recursos para o pagamento de profissionais que integram as equipes de referência, a capacitação de recursos humanos e desenvolvimento de estudos e pesquisas essenciais à execução de serviços, programas e projetos de assistência social, assim como o repassados para entidades e organizações que compõem a rede socioassistencial (TCU, 2013).
Fundo nacional de assistência social (FNAS)
O Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS), proporciona a descentralização dos recursos da assistência social, com objetivo proporcionar recursos para cofinanciar gestão, serviços, programas, projetos e benefícios de assistência social.
Requisitos para recebimento dos recursos do FNAS
Para que os municípios possam receber os recursos financeiros do FNAS, algumas condições expressas na Lei Orgânica de Assistência Social (LOAS), precisam ser cumpridas:
- Instituição e funcionamento do Conselho de Assistência Social;
- Instituição e funcionamento do Fundo de Assistência Social, devidamente constituído como unidade orçamentária;
- Elaboração de um Plano de Assistência Social;
- Comprovação orçamentária de recursos próprios destinados à assistência social, alocados nos respectivos fundos de assistência social;
- Cumprimento das obrigações assumidas pelos municípios;
- Regularidade na aplicação dos recursos; e
- Aprovação das contas do exercício anterior pelo respectivo Conselho.
Não cabe ao Fundo Nacional de Assistência Social a transferência de recursos financeiros diretamente às entidades e organizações de assistência social, somente aos Fundos Estaduais, Municipais e do Distrito Federal, conforme critérios estabelecidos pelos respectivos Conselhos.
Conclusão
Na prática, a finalidade específica de um Fundo para a Política de Assistência Social, tem por objetivo possibilitar a desconcentração da gestão de recursos públicos, dando maior liberdade aos gestores para a aplicação dos recursos financeiros. A disponibilidade de recursos provenientes dos Fundos de Assistência Social aos estados e municípios é imprescindível para a continuidade dos serviços, programas, projetos e benefícios ofertados pela rede socioassistencial. O cofinanciamento proporciona a concretude e têm grande importância na garantia dos direitos sociais.
Referências
- Caderno SUAS VI: Financiamento da Assistência Social no Brasil (MDS, 2013).
- Lei Orgânica da Assistência Social – LOAS (Lei nº 8.742/1993).
- Norma Operacional Básica (NOB/SUAS, 2012).
- Política Nacional de Assistência Social (PNAS/2004).
- Orientações para Conselhos da Área da Assistência Social (TCU, 2013).
Veja também