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Por Letícia Fonseca
A política de Assistência Social entre as políticas que compõe o tripé da Seguridade Social é a mais nova no que se refere à consolidação como política pública. Seu marco legal se deu através da Lei Orgânica é de 1993 – LOAS, e historicamente várias normativas foram surgindo para consolidar e estruturar a Assistência Social enquanto política pública – de dever do Estado e direito do cidadão. Este processo prolongado de consolidação deve-se em grande medida ao seu caráter historicamente estar relacionado à caridade e benesse e não ao direito.
A instituição do Sistema Único de Assistência Social, o SUAS, em 2005, traz forma à condução da política, definindo qual organização deve ser dada para concretizar a efetivação da Assistência Social. Ele organiza quais são os princípios e diretrizes, as funções, a quem deve alcançar e quais as competências dos entes federativos para sua efetivação.
Nesse escopo, a Vigilância Socioassistencial é estabelecida como uma área essencial para corroborar com a organização da oferta de acordo com as necessidades da população.
Leia mais: A Vigilância Socioassistencial na gestão do trabalho e organização do SUAS.
O que é a Vigilância Socioassistencial?
A Vigilância Socioassistencial nada mais é do que uma das funções d a Política de Assistência Social, juntamente com a Proteção Social e a Defesa de Direitos (NOB SUAS, 2012). E la deve ser realizada por meio da produção, sistematização, análise e disseminação de dados, objetivando prover subsídios necessários para que a Proteção Social Básica e Especial sejam ofertadas da forma mais efetiva possível à população de um determinado território.
Mas, a Vigilância não é uma via de mão única, para além da produção de informações, ela precisa ser exercida de modo a gerar resultados, alcançados por meio das ofertas que a Assistência Social se propõe a concretizar. Isso quer dizer que ao sistematizar informações, construir diagnósticos, monitorar e avaliar ações, cumpre o seu objetivo, ou seja, a melhoria e ampliação da oferta das ações socioassistenciais no âmbito municipal, à partir do conhecimento da realidade, ou seja considerando as particularidades de cada território.
Embora o ato de vigilância seja inerente à todas as áreas do SUAS, para que a vigilância socioassistencial cumpra sua função é necessário que ocorra a implementação dessa área. Fato que na conjuntura atual se faz ainda mais necessário com vistas à qualificação das ações de proteção social de forma planejada, continuada e qualificada.
O Pacto de Aprimoramento[1] (2014) propõe como meta a estruturação da gestão do SUAS com competência de Vigilância Socioassistencial, em conjunto com a regulação do SUAS e a Gestão do Trabalho.
Vamos ver a seguir como utilizar a Vigilância Socioassistencial na estruturação do SUAS em seu município.
Impactos da Vigilância na efetivação do SUAS no município
Compreende-se que é de responsabilidade da gestão a efetuação do que está posto nas normativas da Assistência Social. Porém são diversos os fatores que atravessam esse processo de execução e limitam a oferta plena dessa política. Por isso, é necessário ter mensurado tanto a capacidade de alcance por conta do munícipio e o que ainda encontra-se descoberto pela política. E isso é possível por meio da Vigilância Socioasssitencial, que interliga as demandas com a oferta dentro do território.
A vigilância é reforçada na NOB SUAS (2012) por sua função de trazer forma e objetividade concreta ao SUAS. Trabalhamos com um sistema estruturado, dividido em proteções e estas em níveis de complexidades, ramificados dentro de serviços, programas e benefícios. E, portanto, é preciso, para organização e qualificação da oferta, o conhecimento acerca do território de atuação, quais são as necessidades daquela população e dentre elas quais as que competem à Assistência Social.
É por meio da vigilância que podemos ter um diagnóstico das vulnerabilidades e riscos da população de forma territorializada. E à partir dessa visão contrastá-la com a oferta da Rede Socioassistencial. Verificando como tem se dado a qualidade dela e o acesso da população, tendo como base, os princípios centrais da Política Nacional de Assistência – a matricialidade sociofamiliar e a territorialização. Em síntese, dar corpo a Vigilância, é contribuir para uma Gestão do SUAS com caráter mais efetivo, preventivo e proativo.
Passos para utilizar a Vigilância Socioassistencial na estruturação do SUAS no seu município
É importante, antes de tudo, compreender que a Vigilância é uma função desempenhada por todos os trabalhadores, por isso, cada um deve atuar no SUAS com um “olhar vigilante”, o que vai para além de alimentar sistemas nos prazos corretos. O setor da Vigilância Socioassistencial deve ser responsável pela gerência e integração das informações que, em sua maior parte, são levantadas junto aos técnicos, para garantia de uma oferta assertiva.
A área da Vigilância Socioassistencial deve ser instituída para contribuir com a estruturação e manutenção da gestão do SUAS, como expressa o art. 90 da NOB 2012. A criação dessa área essencial do SUAS deve acontecer por meio de Decreto, Portaria ou Lei de regulamentação do SUAS, de acordo com a organização normativa do município.
Para tanto, a estruturação da Vigilância Socioassistencial para além de colaborar com a organização, estruturação de informações, gerenciamento e consulta de sistemas, elaboração de diagnóstico, monitoramento e avaliação [2]das ações em âmbito municipal, corrobora com uma melhor execução financeira. Já que as ações planejadas e organizadas, tendo-se por base os dados, informações e conhecimento sobre o território, otimizam a utilização dos recursos, melhoram os resultados e impactam no aperfeiçoamento das tarefas de gestão da política.
Portanto a elaboração de diagnóstico e indicadores de gestão, análises de informações territoralizadas referentes a qualidade das ofertas versus a demanda por proteção social em âmbito municipal, torna possível para a gestão compreender melhor as especificidades da realidade local e desse modo garante a aplicação estratégica dos recursos financeiros para efetiva execução das ações para a população.
Considerando, então, que em seu município exista um técnico/equipe no setor da Vigilância ou que desempenhe essa função, seguem ações importantes desempenhadas pela Vigilância Socioassistencial na estruturação do SUAS, que fortalecem sua gestão e oferta:
1° Sistematizar dados e produzir diagnósticos territorializados: A Vigilância é responsável por realizar o levantamento e a organização de todas as informações produzidas diariamente pelas equipes da Proteção Social Básica e Especial, assim como da própria Gestão do SUAS. A Sistematização de Dados possibilita a organização dos registros, viabiliza a integração entre os serviços e/ou equipamentos. E para tanto é necessário acontecer a ação paralela de cruzar os dados levantados (importante!) e, acima de tudo, o processo de planejamento induzido pela Vigilância.
Planejar é sair do imediatismo das ações, trocando o “reativo” pelo “proativo”. A Política Assistência Social em todos os seus níveis de complexidade tem trabalhado em resposta às demandas espontâneas, a imersão nessa cultura emergencial causa um distanciamento de ações estratégicas com base no conhecimento do território.
Portanto, o diagnóstico é uma ferramenta de gestão que apresenta dados e informações que possibilitam o conhecimento e análise da realidade do território no tocante às ofertas e demandas, à rede socioassistencial, às demais políticas públicas e, ainda, às descoberturas dessas redes no território, possibilitando a formulação de estratégias com vistas a manutenção e ampliação da proteção social à população usuária.
2° Apoiar tecnicamente as equipes da Rede Socioassistencial no seu fazer profissional à partir da disseminação das informações produzidas. Fazendo com que, os dados levantados pelas equipes de referência resultem na execução de ações e ofertas melhor qualificadas e que promovam o direito dos usuários de acessar serviços, programas e benefícios que respondam efetivamente às suas demandas.
É necessário considerar o atendimento ao usuário, a organização da oferta e o registro dos dados. E desse modo promover estratégias para integrar as Proteções Sociais. Levando-se em conta seus níveis de complexidade para que possam atuar com maior efetividade dentro de suas competências, reconhecendo o território como meio potencial do fazer profissional.
3° Monitorar e avaliar a qualidade da oferta da Proteção Social e as condições de acesso a Rede Socioassistencial. A Vigilância deve analisar se há a necessidade de reordenamento e/ou ampliação da oferta dos serviços para adequar a demanda.
Destarte, quando o município estrutura o SUAS sob o olhar da Vigilância Socioassistencial, esta deve promover a ampliação da capacidade de Proteção Social e Defesa de Direitos à medida em que ela gera subsídios para operacionalização de uma gestão municipal direcionada, com conhecimento das demandas que perpassam a realidade dos seus usuários e o alcance da cobertura da rede socioassistencial.
Leia mais: Como organizar a Vigilância Socioassistencial
Como utilizar a Vigilância Socio Assistencial na estruturação do SUAS – Considerações Finais
Portanto, pensar vigilância é ter um olhar para as vulnerabilidades das famílias de determinado território para além do aparente. É ter a possibilidade de atuar de forma planejada, fugindo do imediatismo das ações, por conhecer a configuração das demandas. É poder contribuir com parâmetros para a oferta socioassistencial, de modo a promover resultados palpáveis no que refere a Proteção Social e a Defesa de Direitos. É possibilitar excelência na oferta e gestão do SUAS no seu município!
REFERÊNCIAS
https://www.sigas.pe.gov.br/files/07092021022231-9.como.implantar.a.vsa.pdf
Brasil. Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário; Fundação Oswaldo Cruz. Curso de atualização em Vigilância Socioassistencial do SUAS: guia do professor. — Brasília, DF: MDSA, Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação, Secretaria Nacional de Assistência Social; Fiocruz, 2016. 40 p. ; 30 cm.
BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Norma Operacional Básica do Sistema Único de Assistência Social – NOB/SUAS. Secretaria Nacional de Assistência Social. Brasília, 2012. Disponível em: https://www.mds.gov.br/webarquivos/arquivo/assistencia_social/nob_suas.pdf. Acesso em 12 out. de 2018.
BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Política Nacional da Assistência Social – PNAS/2004 e Norma Operacional Básica da Assistência Social – NOB/SUAS – Brasília, DF: MDS, 2005.
BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Agrário; Universidade Federal do Rio Grande do Sul. Curso de atualização em vigilância socioassistencial do SUAS. – Brasília, DF: MDSA, Secretaria de Avaliação e Gestão da Informação, Secretaria Nacional de Assistência Social; Centro de Estudos Internacionais sobre o Governo, 2016.
BRASIL. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Orientações Técnicas da Vigilância Socioassistencial. Brasília, DF: MDS. Disponível em: https://www.mds.gov.br/webarquivos/publicacao/assistencia_social/Cadernos/Orientacoes_Vigilancia.pdf. Acesso em 12 out. de 2018.
BRASIL, CapacitaSUAS Caderno 3 (2013) Vigilância Socioassistencial: Garantia do Caráter Público da Política de Assistência Social / Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome, Centro de Estudos e Desenvolvimento de Projetos Especiais da Pontifícia Universidade Católica de São Paulo – 1 ed. – Brasília: MDS, 2013.
[1] O Pacto de Aprimoramento é um compromisso firmado pelos entes federativos, através desse instrumento são estabelecidas as metas e as prioridades nacionais no âmbito do Suas, com o objetivo de aprimorar o SUAS.
[2] Orientações Técnicas da Vigilância Socioassistencial, 2013. p. 23.