A Instrumentalidade na prática do Assistente Social

A Instrumentalidade na prática do Assistente Social

Tempo de leitura: 13 minutos

O conhecimento é, sem dúvida, o principal instrumento de trabalho em qualquer área, pois permite que o profissional tenha uma real dimensão das diversas possibilidades de intervenção. O texto de hoje abordará uma das três dimensões de competência do assistente social: a competência técnico-operativa. Esse conhecimento permite ao profissional definir quais instrumentos serão utilizados no processo de intervenção. É essa capacidade que se denomina de instrumentalidade.

Assim como as mediações que se constituem a partir da singularidade, universalidade e particularidade, a instrumentalidade deve se pautar sobre a realidade social. Sua concretude e complexidade necessitam de um aparato técnico-metodológico específico, de modo que seja possível compreender a totalidade do objeto de intervenção.

Os diferentes espaços sócio-ocupacionais impõem aos profissionais constantes reflexões acerca dos instrumentos a serem utilizados. Trata-se de uma escolha que deve ser ponderada, de modo que o indivíduo não seja penalizado quanto ao acesso dos seus direitos quaisquer que sejam. Tampouco culpabilizado, o que reforçaria a lógica da exclusão social.

Qual o melhor instrumento?

Por atuar diretamente na realidade social, o processo de qualificação profissional deve ser contínuo para o pleno exercício da prática. A apreensão da realidade social possibilita que as demandas apresentadas possam ser subsidiadas com propostas mais amplas de intervenção.

O que define quais instrumentos e técnicas serão utilizados na intervenção são os objetivos profissionais, ou seja, o ato de agir que requer planejamento para a execução da ação profissional. É no momento da execução que a metodologia a ser aplicada é construída, onde o profissional deve se questionar do “porquê”,  “para quê”  e ”como” determinado instrumento deve ser utilizado.

Vejamos agora quais são os principais instrumentos que caracterizam a prática do exercício profissional. Para tanto, o assunto será abordado em duas etapas:   instrumentos diretos e  instrumentos indiretos.

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Instrumentos Diretos

Os Instrumentos diretos são aqueles que proporcionam uma interação face a face, ou seja, por meio da linguagem gestual, pelo diálogo ou pela entonação.

São instrumentos diretos:

1. Entrevista

 Instrumento que permite realizar uma escuta qualificada, a entrevista por meio do processo de diálogo, visa estabelecer uma relação com o usuário, com objetivo de conhecer e intervir em sua realidade social, econômica, cultural e política. Pode ser individual ou grupal.

Sendo assim, podemos afirmar que a entrevista possui dois objetivos principais:

  • Promover o conhecimento da realidade dos usuários;
  • Realizar os encaminhamentos e orientações necessários para a garantia de direitos.

 O diálogo propicia uma análise crítica da situação, pois a partir da fala do usuário é que o assistente social consegue identificar as questões que permeiam a sua realidade, utilizando-se da mediação como um referencial teórico para sua intervenção.

Etapas da Entrevista

Antes de iniciá-la, o profissional precisa estar preparado e decidir qual será o tipo de entrevista a ser realizada. É fundamental que haja um planejamento da ação a ser executada, onde deverão ser levados em consideração o conhecimento técnico do entrevistador, a formulação conjunta de questões subjetivas e objetivas, o registro das respostas e o conhecimento prévio do campo.

O planejamento se faz necessário para que não ocorra imprevistos ou esquecimentos de aspectos importantes por parte do entrevistador, muito menos a retenção de dados importantes e que o entrevistado não seja influenciado pelo entrevistador quanto às respostas. É importante frisar que no planejamento, “os objetivos do profissional, os objetivos institucionais e as necessidades dos usuários são relevantes para decidir qual a melhor modalidade de entrevista e se ela deverá ser individual ou grupal” (LAVORATTI, 2016).

A operacionalização da entrevista deve permitir ao entrevistado clareza quanto às questões expostas pelos usuários e os possíveis encaminhamentos para seu acesso aos programas, projetos, serviços e benefícios.

Vale ressaltar que, preparar um espaço físico adequado é importante para a entrevista, permitindo assim uma exposição clara dos objetivos da entrevista, a comunicação entre o assistente social e, ainda, usuário e a manutenção do sigilo profissional.

O acolhimento é importante para que o usuário possa expor seus problemas, além de contar com uma escuta ativa e com a compreensão de um profissional que tenha por objetivo a garantia dos seus direitos sociais.

De m que a coleta de dados possa subsidiar os questionamentos e reflexões, é preciso estabelecer um diálogo para que a complexidade da realidade e a correlação entre os fatos possam ser compreendidos pelo assistente social. O profissional deve antes de tudo se abster de “não fazer críticas” e “evitar julgar o usuário”.

Registro e Sistematização das Informações coletadas

Etapa final da entrevista que tem como objetivo contribuir para a integralidade do atendimento, ou seja, por meio de uma linguagem clara, técnica e objetiva, o profissional retrata a competência teórico-metodológica e técnico-operacional do Serviço Social.

Tipos de entrevista

Ao escolher o tipo de entrevista, o assistente social deve fazer uma reflexão acerca dos objetivos específicos que ele espera alcançar. Dentre as formas de entrevista, que podem ser utilizadas pelo assistente social estão:

  • Entrevista estruturada: através de um roteiro previamente elaborado, o entrevistador formula as perguntas conforme a ordem estabelecida. Dentre as vantagens desse tipo de entrevista, estão a rapidez na aplicação das perguntas e o desenvolvimento de levantamentos sociais. Já a desvantagem, está na dificuldade da análise dos dados coletados que, dependendo do questionário pode mascarar a captação de elementos importantes para o trabalho do assistente social, como os sentimentos e motivações que ocasionaram a realização da entrevista. Geralmente, este instrumental, “têm por objetivo “traçar o perfil socioeconômico dos usuários, além de outras características exigidas como critérios de inclusão em programas sociais” (LAVORATTI, 2016) .
  • Entrevista não estruturada: este tipo de entrevista permite ao entrevistador explorar amplamente uma determinada questão. Visa obter dados relevantes quanto à intervenção profissional. Segundo Lavoratti (2016) apud Kisnerman (1978, p.27), as perguntas devem ser formuladas sem que haja introdução das respostas, permitindo assim “qualificar dados com o entrevistado, capacitar, avaliar, orientar, informar, reforçar a auto-estima e gerar participação”.
  • Entrevista semi-estruturada: neste tipo de entrevista são elaboradas perguntas abertas e fechadas. A entrevista aberta semi-estruturada é a mais utilizada por favorecer uma maior interação entre entrevistador e entrevistado, pelo fato de não se restringir apenas ao tema questionado. Possui questões norteadoras e objetivos preestabelecidos, abrindo caminho para que outros aspectos não previstos pelo entrevistador possam ser trabalhados.

2. Visita

A visita é um instrumento de suma importância e pode ser domiciliar ou institucional.

Visita domiciliar

A visita domiciliar consiste em conhecer a realidade social, de uma determinada família, ou seja, analisar o contexto familiar e o modo de vida, suas vulnerabilidades e potencialidades, permitindo ao assistente social observar o indivíduo em seu meio social, além de realizar o acompanhamento e os encaminhamentos necessários para a rede de atendimento.

No âmbito do Centro de Referência de Assistência Social (CRAS), a visita domiciliar é um dos instrumentos estratégicos utilizados para a abordagem com as famílias, pois possibilita que o profissional se aproxime da realidade vivenciada pelos grupos familiares nos territórios, podendo com isso acompanhar e analisar melhor o resultado de suas intervenções.

Visita institucional

A visita institucional consiste em conhecer e avaliar a qualidade dos serviços prestados pelas entidades sociais públicas ou privadas, e para isso requer do assistente social enquanto Secretário Executivo, um intenso conhecimento teórico e técnico sobre as políticas sociais. Este tipo de visita  é de competência exclusiva dos Conselhos de Direito Exemplo: visita de fiscalização a uma Instituição de Longa Permanência (ILPI) pelo Conselho Municipal da Assistência Social com objetivo de averiguar se a entidade oferece instalações físicas em condições adequadas de  acessibilidade, habitabilidade, segurança, higiene e salubridade aos idosos residentes.

3. Acolhimento Social

O acolhimento social é um processo de intervenção profissional que envolve a escuta social qualificada. Tem por objetivo identificar o problema de determinada situação no âmbito individual ou coletivo.

4. Acompanhamento Social

Procedimento técnico de caráter continuado, que necessita de um vínculo entre o usuário e o profissional, como por exemplo, o acompanhamento sócio-familiar detectado durante a entrevista, e que determina os encaminhamentos necessários.

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5. Atendimento Social

Importante espaço de atuação profissional que envolve um conjunto de ações direcionadas ao atendimento de famílias e indivíduos, visando o acesso aos direitos sociais, políticos e civis nas diferentes políticas setoriais, como: assistência social, saúde, educação, previdência, habitação, bem como na prevenção de situações de risco. O Atendimento Social é viabilizado pelas equipes que atuam nos diversos equipamentos de assistência social como os Centros de Referência da Assistência Social (CRAS) e os Centros Especializados de Referência da Assistência Social (CREAS).

6. Trabalho em Grupo

Antes de mais nada, é importante ressaltar que de acordo com as orientações  do conjunto CFESS/CRESS, a formação profissional do assistente social não está habilitada para o desenvolvimento de trabalhos no campo terapêutico. Dessa forma, os trabalhos em grupos devem ser utilizados apenas como recurso para o desenvolvimento de trabalhos educativos, como os desenvolvidos nos CRAS,  CREAS e demais espaços sócio-ocupacionais. 

Organizar pessoas através do trabalho com grupos exige do profissional planejamento, e como mediador, o assistente social tem a possibilidade de contribuir para a construção do conhecimento, potencializando espaços de reflexão mediante análise conjunta do contexto das relações sociais na qual o grupo está inserido (formação da identidade e de pertencimento do grupo).

7. Dinâmicas de Grupo

É uma técnica que utiliza jogos, brincadeiras ou simulações de modo a provocar uma reflexão acerca de uma determinada temática que tenha relação com o objeto de intervenção, e que no caso do Serviço Social, tem o assistente social como facilitador, o que requer do profissional habilidades teóricas e uma postura política democrática de controle no processo da dinâmica.

8. Reunião

A reunião é um instrumento presente no cotidiano de trabalho do assistente social, seja na atuação com grupos, nos encontros com usuários das políticas públicas ou nas reuniões de equipe. A reunião tem como característica, promover e intervir em espaços coletivos provocando uma reflexão crítica.

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Instrumentos indiretos

Os instrumentos indiretos consistem no registro da interação realizada pelo instrumental face a face, independente da metodologia utilizada, entrevista, visita, acolhimento e/ou atendimento social.

São instrumentos diretos:

1. Estudo Social

Instrumento específico do assistente social que tem por finalidade conhecer com profundidade e de forma crítica, determinada situação ou expressão da questão social, objeto de intervenção profissional nos aspectos socioeconômicos.

O Estudo Social possibilita o acesso a determinados serviços, programas, e benefícios, bem como na efetivação de direitos ou subsidiar pareceres sociais. Têm a família como elemento central da análise que visa compreender os diversos vínculos e a estrutura das relações familiares vivenciadas pelos sujeitos, de modo a garantir a proteção de seus membros.

2. Parecer Social

É a avaliação conclusiva, teórica e técnica realizada pelo assistente social, dos dados coletados após a finalização do estudo social. Além de conter o posicionamento do profissional acerca da realidade social estudada, deve evidenciar os aspectos significativos para a viabilização de direitos sociais, fazendo referência aos elementos analíticos e aos instrumentos utilizados nas dimensões investigativa e interventiva.


Veja também: Conheça a diferença entre Parecer Social e Laudo Social!


3. Relatório Social

Os relatórios são instrumentos de sistematização da prática do assistente social, que contém o relato dos dados coletados, das intervenções realizadas e das informações adquiridas.

4. Perícia Social

No âmbito das políticas sociais, a perícia social tem o importante papel de ser um instrumento que reforça as decisões referentes à concessão de benefícios, garantindo assim o acesso aos direitos sociais e a superação da vulnerabilidade e risco social.

A perícia social é uma técnica que exige planejamento, que consiste no levantamento de documentos e coleta dados já existentes acerca de uma determinada demanda social, e que tem início pelo Estudo Social.

No campo jurídico, a perícia social constitui-se em um meio de prova, por se tratar de uma declaração técnica, conforme esquema a seguir:

Infográfico descrevendo os instrumentais perícia social, estudo social, parecer social e laudo social. Estes relatórios são parte da instrumentalidade do serviço social.

Conclusão

No âmbito da intervenção profissional, o Serviço Social visa produzir as mudanças necessárias no cotidiano da vida social dos usuários atendidos. E é através da competência técnico-operativa que o Assistente Social encontra o resultado da capacidade criativa e da compreensão da realidade social, para que a intervenção possa ser realizada com eficácia, responsabilidade e competência profissional.

Existem outras técnicas e metodologias de ação utilizadas pelos assistentes sociais, como a mobilização, os registros em atas e os diários de campo, no entanto, este artigo pautou-se naqueles que são mais utilizados na prática.

Cabe aos assistentes sociais a importância de desvendar e interpretar as condições objetivas e subjetivas que permeiam o exercício profissional, condição necessária para o trabalho social enquanto categoria constitutiva.

Veja também

Referências

  • COSTA, Dourival e LAVORATTI, Cleide.  Instrumentos Técnico-Operativos no Serviço Social: um debate necessário (2016).
  • GUERRA, Yolanda. A instrumentalidade no Trabalho do Assistente Social (2007).
  • SOUSA, C. T. A prática do assistente social: conhecimento, instrumentalidade e  intervenção profissional (2008).

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