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“Em briga de marido e mulher não se mete a colher” Será? Porque devemos permitir que mulheres sejam brutalmente assassinadas, espancadas, humilhadas, torturadas e violentadas? Graças a coragem daquelas que sofreram todo tipo de violência, é que a realidade começou a mudar. A partir do momento em que o chamado “ciclo de violência” começou a ser combatido, houve a necessidade do desenvolvimento e implementação de políticas públicas que assegurassem às mulheres vítimas da violência, mecanismos para coibir e prevenir a violência doméstica e familiar.
Em 2003, com a criação da Secretaria de Políticas para as Mulheres (SPM), formulou-se a Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, com objetivo de promover ações de enfrentamento à violência contra as mulheres.
É dentro deste contexto, no âmbito do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), que hoje abordaremos o Serviço de Acolhimento Institucional Para Mulheres em Situação de Violência, ofertado pela Proteção Social Especial de Alta Complexidade. Um serviço que possui questões fundamentais para a garantia do acesso das mulheres aos serviços especializados, e que tem o abrigamento como uma alternativa de extrema relevância, em situações de violência ao ofertar locais seguros e protegidos.
Serviço de Acolhimento Institucional Para Mulheres em Situação de Violência
Conforme previsto na Lei n° 11.340/2006 (Lei Maria da Penha), cabe ressaltar que no que tange ao atendimento às mulheres em Casas-Abrigo, as medidas protetivas devem garantir a integridade física e moral da mulher nos casos de risco de morte.
Este serviço de acolhimento institucional funciona em unidades inseridas na comunidade com características residenciais, afim de proporcionar um ambiente acolhedor e estrutura física adequadas, visando ao desenvolvimento de relações mais próximas do ambiente familiar.
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Como objetivos gerais, o serviço deve garantir a integridade física e psicológica das mulheres em risco de morte e de seus filhos, promovendo ainda o exercício dos direitos da sua cidadania, de modo a contribuir para o resgate e fortalecimento da sua autoestima.
Já dentre os objetivos específicos, o serviço visa:
- Proteger mulheres e prevenir a continuidade de situações de violência;
- Propiciar condições de segurança física e emocional e o fortalecimento da autoestima;
- Identificar situações de violência e suas causas e produzir dados para o sistema de vigilância socioassistencial;
- Possibilitar a construção de projetos pessoais visando à superação da situação de violência e o desenvolvimento de capacidade e oportunidades para o desenvolvimento de autonomia pessoal e social;
- Promover o acesso à rede de qualificação e requalificação profissional com vistas à inclusão produtiva;
- Assegurar um atendimento integral e interdisciplinar às mulheres e seus filhos, em especial nas áreas psicológica, social e jurídica.
O acolhimento institucional deve assegurar um atendimento personalizado, e suas edificações devem ser organizadas, de forma a atender aos requisitos previstos nos regulamentos e às necessidades das usuárias, com a oferta de condições de acessibilidade e privacidade, habitabilidade, higiene, salubridade, segurança, bem como favorecer o convívio familiar e comunitário local.
Casas-Abrigo: Proteção em Ambiente Acolhedor e Seguro
Conforme a Política Nacional de Enfrentamento à Violência contra as Mulheres, “…o abrigamento inclui outras medidas de acolhimento que podem constituir-se em programas e benefícios…que assegurem o bem-estar físico, psicológico e social das mulheres em situação de violência, assim como sua segurança pessoal e familiar.” O abrigamento em serviços de acolhimento institucional, é a resposta dada pelo Estado às mulheres que se encontram em situação de violência sob grave ameaça e risco de morte.
Somente em 2009, as Casas-Abrigo foram incluídas nos serviços da proteção social especial de alta complexidade, através da Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais, com a denominação de Serviço de Acolhimento Institucional Para Mulheres em Situação de Violência. A incorporação das Casas-Abrigo na tipificação, passou a representar um importante instrumento que compõe a rede de atendimento à mulher em situação de violência.
É importante ressaltar que existem diferenças entre Casa-Abrigo e Casa de Acolhimento, conforme podemos observar na tabela abaixo:
Características | Casa-Abrigo | Casa de Acolhimento |
Nomenclatura na tipificação sócio-assistencial |
Serviço de Acolhimento Institucional para mulheres em situação de violência (Resolução CNAS nº 109/2009). | Serviço não incorporado aos serviços socioassistenciais. |
Natureza | Serviço público, de longa duração (de 90 a 180 dias) e, em geral, sigiloso. | Serviço público, de curta duração (até 15 dias) e não-sigiloso. |
Público-alvo | Mulheres em situação de violência doméstica e familiar sob risco de morte (acompanhadas ou não de seus filhos/as). | Mulheres em situação de violência de gênero (em especial da doméstica e familiar e vítimas do tráfico de pessoas), que não estejam sob risco de morte (acompanhadas ou não de seus filhos/as). |
Objetivo do Serviço |
– Garantir a integridade física e emocional das mulheres; – Auxiliar no processo de reorganização da vida das mulheres e no resgate de sua autoestima. |
– Garantir a integridade física e emocional das mulheres; – Realizar diagnóstico da situação da mulher para encaminhamentos Necessários. |
Fonte:Diretrizes Nacionais para o Abrigamento de Mulheres em Situação de Risco e Violência. Brasília, (SPM; PR, 2011).
Procedimentos de Atendimento à Mulher em Situação de Violência Doméstica e Familiar
De acordo com a tipificação, “o serviço de acolhimento institucional deve ser desenvolvido em local sigiloso, com funcionamento em regime de co-gestão, que assegure a obrigatoriedade de manter o sigilo quanto à identidade das usuárias. Em articulação com a rede de serviços socioassistenciais, das demais políticas públicas e do Sistema de Justiça, deve ser ofertado atendimento jurídico e psicológico para as usuárias e seu filho e/ou dependente quando estiver sob sua responsabilidade.”
As diretrizes que regulamentam o funcionamento das Casas-Abrigo através do Serviço de Acolhimento Institucional Para Mulheres em Situação de Violência, estão em consonância com o que preconiza a tipificação, e as deliberações do “Workshop Nacional da Política de Abrigamento, realizado em 2009.
Entenda também: Guia definitivo: Serviços, Programas e Benefícios Socioassistenciais
O acesso ao Serviço de Acolhimento Institucional Para Mulheres em Situação de Violência, devem ser prestados prioritariamente pelos Centros de Referência, Delegacias Especializadas de Atendimento à Mulher, Defensoria Pública, Promotorias, Conselhos Tutelares, Conselhos Municipais da Criança e do Adolescente, serviços de saúde, organismos governamentais de políticas para as mulheres, e outras organizações da sociedade civil comprometidas com a questão dos direitos humanos e das mulheres.
Medidas Integradas de Proteção no Âmbito do SUAS
Por se tratar de um serviço de caráter sigiloso e temporário, existem algumas medidas integradas de proteção a serem seguidas para que se garanta a integridade física e psicológica das mulheres em situação de violência:
1. Vinculação: por estarem vinculadas à assistência social, o serviço de acolhimento nas Casas-Abrigo, deverão proporcionar às usuárias uma maior garantia de sustentabilidade.
2. Institucionalização: o acolhimento institucional deve garantir segurança às mulheres e profissionais que atuam no serviço.
3. Articulação permanente com a Segurança Pública: uma vez inseridas nas Casas-Abrigo, as mulheres devem ter assegurados pelo serviço, a garantia de seus direitos e a de proteção para ela e seus filhos. Dessa forma, cabe ao serviço estabelecer parcerias com a Segurança Pública.
4. Sigilo: desde a criação das Casas-Abrigo, o sigilo têm sido um dos requisitos para a implantação e existência do Serviço de Acolhimento Institucional Para Mulheres em Situação de Violência.
Apesar das diretrizes e parâmetros que normatizam o Serviço de Acolhimento Institucional Para Mulheres em Situação de Violência, a exigência do sigilo acarreta uma série de dificuldades para manter o serviço em funcionamento, como por exemplo: as constantes mudanças de endereço, a impossibilidade de um imóvel próprio para melhor atender as mulheres em situação de grave ameaça de morte, a locação de imóveis que possuam condições necessárias que o serviço deve ofertar (acessibilidade, segurança etc), e a quebra de sigilo do endereço.
É importante ressaltar que fora dos limites físicos das Casas-Abrigo, é de competência da Polícia garantir a proteção pessoal das mulheres em situação de violência. Quanto a segurança do serviço, a competência cabe a Guarda Municipal ou Polícia Militar.
Conclusão
Como podemos observar, é preciso debater a questão acerca do atendimento ofertado às mulheres em situação de violência, para que o serviço de acolhimento institucional possa ser aprimorado. Existem desafios que perpassam pelo atendimento, tanto no âmbito do SUAS quanto pela rede intersetorial de proteção. É preciso promover a articulação como prevê a Política de Assistência Social, para que novas estratégias de enfrentamento possam ser construídas.
Referências Bibliográficas
Diretrizes Nacionais para o Abrigamento de Mulheres em Situação de Risco e Violência. Brasília, (SPM; PR, 2011). Lei n° 11.340/2006 (Lei Maria da Penha).
Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais (2009).
Veja também:
- O que é ofertado na proteção social básica e na proteção social especial
- Atendimento ás famílias e indivíduos em situação de riscos e vulnerabilidade
- O papel do assistente social na mediação de conflitos