Normativas sobre o SUAS: Principais marcos regulatórios de 2023

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Por Rosângela Ribeiro

Os marcos regulatórios são imprescindíveis para geração de segurança jurídica e técnica na operacionalização das políticas públicas, sobretudo para assimilar e nivelar uma compreensão mais assertiva a respeito dos objetivos, princípios e diretrizes das ações propostas. Nesse sentido, o Sistema Único de Assistência Social (SUAS) conta com um referencial normativo substancial, originário da Constituição Federal de 1988, desde o Art. 3° ao citar os objetivos da República, tais como:

I – construir uma sociedade livre, justa e solidária;

II – garantir o desenvolvimento nacional;

III – erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as desigualdades sociais e regionais;

IV – promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e quaisquer outras formas de discriminação.

Assim como os artigos 194,  203 e 204, que conjuntamente expressam lugar de direito à Política de Assistência Social, tanto ao integrar o tripé da Seguridade Social, quanto ao definir diretrizes à política. A partir dessas definições se regulamenta por meio da Lei orgânica de Assistência Social (LOAS), lei nº 8.742/93.

Esse processo de releitura de marcos normativos é fundamental para gerar conexões e determinar objetivo e finalidade a execução de ações, serviços, programas e benefícios socioassistenciais em relação ao seu orçamento. E de tempos em tempos considerando as demandas e a dinamicidade das questões sociais apresentadas às políticas públicas e sociais no Brasil, os normativos passam a ser remodelados de acordo com as indigencias, bem como o próprio desenvolvimento do Sistema de Proteção Social Brasileiro, assim, novos marcos vão se integrando a regulação do SUAS.

Recentemente a esse marco regulatório foram acrescidas normas com o intuito de regular e orientar os gestores municipais no processo de gestão da Política de Assistência Social. Vamos apresentar a seguir alguns dos principais normativos publicados no atual exercício do ano de 2023.

Portaria MDS 871, de 29 de março de 2023

Regulamenta as ações do Programa de Fortalecimento Emergencial do Atendimento do Cadastro Único no Sistema Único da Assistência Social, instituído e aprovado por meio da Resolução MDS/CIT nº 01, de 07 de fevereiro de 2023, da Comissão Intergestores Tripartite (CIT) e Resolução MDS/CNAS nº 96, de 15 de fevereiro de 2023, do Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS).

A norma trata do fortalecimento da capacidade institucional do atendimento integral e o cadastramento das famílias vulneráveis no Cadastro Único no Suas, cujo objetivo  é a atualização e regularização dos registros dos cadastros unipessoais. De acordo com o Art. 1°, os objetivos do PROCAD são priorizar a busca ativa das famílias que pertencem aos Grupos Populacionais Tradicionais e Específicos – GPTE, como a população em situação de rua, povos indígenas e crianças em situação de trabalho infantil, bem como estimular a atualização e regularização dos registros com inconsistências, para que os programas sociais que utilizam o Cadastro Único como ferramenta possam atender a quem mais precisa, além de fortalecer a capacidade institucional dos municípios, estados e do Distrito Federal, tendo em vista que a qualificação do CadÚnico se faz necessária para a formulação, implementação, monitoramento e avaliação de políticas públicas.

A portaria elenca no Art. 2º parágrafo único e Art. 4° as possibilidades da utilização dos recursos, tais como a aquisição de equipamentos e materiais permanentes, levando em consideração os itens previstos no anexo I e II da Portaria MC 69/2022, onde estabelecem o rol padronizado de veículos, equipamentos e materiais permanentes, além da contratação, disponibilização e remuneração de pessoal, aquisição e alocação de bens e serviços que contribuam para o fortalecimento da capacidade institucional de atendimento do público do CadÚnico.  Fundamental compreender que o espaço de execução do recurso se dá conforme Art. 9º onerando o Programa de Trabalho 08.244.5031.219E – Ações de Proteção Social Básica, podendo ser reprogramados caso seja identificado saldo, respeitando a lógica já estabelecida.

Nessa perspectiva, é fundamental que se atente aos limites operacionais do programa frente aos princípios, objetivos e diretrizes, haja vista que a utilização dos recursos deve ser feita sempre de acordo com a finalidade e o objetivo, referenciando a Tipificação Nacional dos Serviços Socioassistenciais.

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Portaria MDS 898, de 12 de julho de 2023

Dispõe sobre procedimentos para a Ação de Distribuição de Alimentos (ADA) nos municípios em situação de emergência ou estado de calamidade pública.

Para que seja possível garantir proteção social em contextos de emergência ou calamidade pública, é necessário que haja articulação de diversos atores para que se estabeleça competências e responsabilidades de acordo com os limites de cada legislação. Nesse sentido, as definições referentes ao procedimento da solicitação de emergência ou calamidade pública devem estar em consonância com o Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil (SINPDEC), ou seja, o decreto de anormalidade deve ser reconhecido em âmbito federal por meio da Secretaria Nacional de Proteção e Defesa Civil (SEDEC) e deverão respeitar o prazo de 180 dias de acordo com a legislação do SINPDEC, além da exigência do termo de aceite para o recebimento das cestas que constam no Anexo I da publicação.

Nas situações em que houver atendimento a povos e comunidades tradicionais e demais grupos populacionais específicos, os órgãos demandantes poderão apresentar justificativa fundamentada, sem exigir a decretação de situação de emergência ou de estado de calamidade pública conforme o Art. 1º, parágrafo único da portaria 898/2023.

Dessa maneira, vale lembrar que é de responsabilidade dos municípios a indicação da quantidade de cestas que pretende distribuir, bem como a indicação do setor responsável pela gestão, coordenação e distribuição dos gêneros alimentícios e de um servidor para coordenação-geral da ação de distribuição. Ele será responsável por acompanhar e fiscalizar a retirada das cestas. E para a prestação de contas, o setor responsável deverá elaborar um relatório de execução acompanhado da lista de beneficiários, em que deve constar o nome, NIS ou CPF, e a assinatura dos que receberam as cestas. O relatório será submetido à avaliação do Conselho Municipal de Assistência Social (CMAS) no prazo de até 60 dias corridos após a distribuição dos alimentos.

Cabe destacar que de acordo com as diretrizes para a atuação da política de Assistência Social em contextos de emergência socioassistencial, é fundamental que a população afetada tenha acesso a serviços básicos disponiveis com rapidez nas ações, especialmente quando se refere a questões de sobrevivência como alimentação, água e abrigo de forma a reduzir a vulnerabilidade das famílias e do território.

Portaria MDS 884, de maio de 2023

Dispõe sobre a reprogramação de saldos financeiros constantes dos fundos de assistência social dos Estados, do Distrito Federal e dos Municípios, provenientes de repasses do Fundo Nacional de Assistência Social, que foram transferidos para enfrentamento da pandemia de COVID-19, para execução pelos entes federados até 31 de dezembro de 2023.

Em decorrência do enfrentamento da Covid-19, no ano de 2020 os municípios receberam em conta recursos extraordinários oriundos das portarias 369/2020 e 378/2020 destinados para estruturação da rede do Suas e a realização de ações socioassistenciais, definindo que o crédito extraordinário é voltado para aquisição de equipamentos de proteção individual (EPIs) e de alimentos, além do acolhimento de público prioritário indicado na normativa, além dos recursos para incremento temporário na execução de ações socioassistenciais no âmbito da Proteção Social Básica e Especial. Para isso, havia a necessidade de considerar os serviços socioassistenciais ofertados nos Centros de Referência da Assistência Social (Cras) e nos Centros de Referência Especializado da Assistência Social (Creas). No entanto, estes recursos só haviam sido autorizados para utilização até 31 de dezembro de 2021.

Contudo, no ano de 2022 foi publicada por meio Emenda Constitucional 126/2022 em seu Art. 122 a possibilidade da execução das transferências financeiras através do Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS) diretamente aos fundos estaduais, municipais e do Distrito Federal, podendo utilizar os recursos até 31 de dezembro de 2023. Entretanto, a finalidade inicial para execução de ações socioassistenciais e estruturação da rede, aquisição de Equipamentos de Proteção Individual e os créditos para incremento temporário na execução de ações socioassistenciais permaneciam até a publicação de uma norma complementar.

Dessa forma, a portaria 884/2023 foi publicada como norma complementar com a finalidade de apresentar novas possibilidades para utilização dos recursos restantes em conta, a fim de dar continuidade aos atendimentos socioassistenciais e do trabalho social junto às famílias e indivíduos em articulação das ações intersetoriais para contribuir com a reconstrução das condições de vida familiar e comunitária, elaborando estudos e diagnósticos em conjunto com a coordenação e equipe das unidades socioassistenciais de referência de forma a monitorar situações de vulnerabilidade e risco decorrentes da emergência, visando a prevenir o agravamento dessas situações por meio das ofertas socioassistenciais. Aqui cabe deixar claro que a finalidade da execução dos recursos pode seguir sua origem, mas também focar suas estratégias, conforme Art.2º em qualquer circunstância de extrema vulnerabilidade decorrente de calamidade pública e/ou, observando-se, no que couber, diante do contexto pós-pandêmico de COVID-19.

Nesse novo escopo da ampliação do uso do recurso, é importante se atentar aos que permanecerem em conta até 31 de dezembro de 2023, visto que deverão ser devolvidos ao FNAS por meio de Guia de Recolhimento da União – GRU.

Portaria MDS 886, de 18 de maio de 2023

Estabelece diretrizes e procedimentos para a execução de despesas extraordinárias em ações e serviços do SUAS, autorizadas na Lei Orçamentária Anual de 2023, e com base no art. 8º da Emenda Constitucional nº 126, de 2022.

Considerando o marco histórico da política Política de Assistência Social, o Ministério do Desenvolvimento e Assistência Social, Família e Combate à Fome (MDS) viabilzou procedimentos para execução de despesas extraordinárias em ações e serviços do Sistema Único de Assistência Social (SUAS) autorizadas na Lei Orçamentária Anual de 2023 de acordo com o Art. 1º da portaria 886/2023, no qual os municípios poderão solicitar recursos para custeio (GND 3), considerando o teto vinculado ao porte do Município descrito na Portaria. Municípios de pequeno porte I poderão solicitar até R$ 325 mil, enquanto os de pequeno porte II terão limite de R$ 600 mil. Para Municípios de médio porte, o valor máximo será de R$ 1,05 milhão e para os de grande porte de até R$ 2,3 milhões. Metrópoles, capitais e o Distrito Federal terão à disposição até R$ 15 milhões, enquanto os Estados poderão solicitar até R$ 2,55 milhões. Há ainda a possibilidade de conjunta ou isoladamente solicitar recursos para investimento (GND 4) destacados no Art. 5º

As destinações apresentadas pelos gestores de assistência social estaduais, municipais e do Distrito Federal são para financiamento dos serviços nacionalmente tipificados. O cadastro para solicitação dos recursos é feito pelo gestor e/ou o adjunto por meio do sistema “Minha rede Suas”, com acesso disponível no Sistema de Autenticação e Autorização (SAA), no módulo “requerimento/solicitações”. O sistema ficará disponível no período de 17 a 24 de agosto. Após o cadastro, a segunda etapa seguirá para avaliação do órgão gestor federal considerando a disponibilidade orçamentária e financeira, onde os gestores municipais e estaduais serão notificados para operacionalizar as programações de acordo com a classificação. Se forem destinadas ao incremento temporário, deverão ser instrumentalizadas pelo Sistema de Gestão de

Transferências Voluntárias (Sigtv) e seguir o disposto na Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais, bem como a aquisição de materiais permanentes seguindo a portaria 69/2022. Já os recursos destinados a obras deverão ser cadastrados no transferegov.br.

Cabe destacar que os recursos são vedados para utilização de qualquer tipo de construção, ampliação e reforma de imóveis em entidades privadas ou imóveis que não sejam próprios com os recursos repassados pelo Fundo Nacional de Assistência Social (FNAS), e deverão ser utilizados exclusivamente para viabilizar/incrementar a oferta de serviços socioassistenciais prestados pela instituição.

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Portaria MDS 887, de 26 de maio de 2023

Reajuste do valor de referência do Índice de Gestão Descentralizada do Programa Bolsa Família e do Cadastro Único (IGD/PBF) de R$ 3,50 para R$ 4,00, por cadastro válido, a ser repassado aos Municípios.

Para o fortalecimento da Política Nacional da Assistência Social algumas ferramentas foram criadas no intuito de garantir o aprimoramento da gestão. Entre elas, o apoio financeiro denominado Índice de Gestão Descentralizada – IGD/PBF, no qual permite aos gestores, conselheiros, técnicos, usuários e entidades de assistência social possam acompanhar e aferir a qualidade da gestão descentralizada dos programas, serviços e benefícios socioassistenciais, bem como das ações de coordenação, monitoramento e avaliação do respectivo sistema. A meta está descrita no Art. º 12-A da Loas.

Nessa perspectiva, com base nos resultados obtidos pelas gestões municipais, estaduais e do Distrito Federal, o IGD atua como um importante mecanismo indutor do alcance das metas pactuadas nacionalmente para o aprimoramento da gestão do SUAS e da qualidade dos serviços ofertados a população, utilizando como cálculo 4 fatores: taxa de atualização cadastral e taxas de acompanhamento das condicionalidades de saúde e educação; adesão ao Suas; prestação de contas; e parecer das contas do uso dos recursos.

Desde o exercício financeiro de 2010 foi facultado somente três reajustes para o IGD/PBF, sendo o primeiro em 2012, quando o valor de referência passou de R$ 2,50 para R$ 3,25, no ano de 2022, em que o reajuste foi de R$ 0,25, e no ano de 2023, ou seja, o valor passou de R$ 3,50 para R$ 4,00, mas não considerou os valores corrigidos de acordo com Índice Nacional de Preços ao Consumidor Amplo (IPCA).

Assim, recentemente com a publicação da portaria 887/2023, a União reajustou o valor de repasse para apoio financeiro aos municípios que corresponde a indicadores de qualidade da gestão no valor de R$ 4,00. Compreende-se que mesmo com o reajuste recente, é necessário considerar o compromisso e a responsabilidade dos Municípios quanto as atribuições dos Entes em relação ao cadastramento das famílias, busca ativa com pré-cadastros preenchidos pelo aplicativo para validação e complementação, e a atualização e confirmação da atualidade dos registros cadastrais, tendo em vista que o valor de cofinanciamento repassado não é suficiente para o custeio e manutenção das unidades de cadastramento.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

A operacionalização da Política de Assistência Social é posta como um grande desafio perante a realidade dos entes, sobretudo pela insegurança jurídica e técnica relacionada aos atos regulamentares e ações de cumprimento das regulamentações. Nesse sentido, as normativas e orientações são fundamentais para construção, implementação e monitoramento das seguranças afiançadas no escopo da Loas, bem como a compreensão das premissas da regulação na fiscalização, controle e avaliação, garantindo que gestores possam compreender a instrumentalização e consolidação das ações de normatização do Suas.

É imprenscindível que na dinâmica da execução e no processo de gestão do Suas, as normativas sejam incorporadas como elementos fundamentais para fomentar a efetividade no processo político organizativo das ações da Assistência Social, tais como o marco regulatório, de forma a compatibilizar a aplicação das recomendações na gestão.

Desse modo, além de garantir e assegurar melhores condições no atendimento da população usuária, gestores e técnicos poderão ter respaldo técnico e jurídico a partir de normas e procedimentos elencados em cada objetivo, princípio e diretriz na regulamentação das legislações vigentes.

 

 

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