A atuação dos Fóruns de Trabalhadores e Trabalhadoras do SUAS

Tempo de leitura: 9 minutos

Por Gisele Rodrigues

A organização coletiva dos trabalhadores da Assistência Social remonta à sua inserção nas organizações da classe trabalhadora – sindicatos, partidos políticos, movimentos sociais e associações profissionais. Porém, a Constituição Federal de 1988, ao assegurar a Assistência Social como política pública e os mecanismos de participação e controle social no Estado, produziu um ponto de inflexão na organização e atuação política desses trabalhadores.

Na Política de Assistência Social, a participação social desempenha um papel fundamental para garantir a efetividade e a qualidade dos serviços e benefícios voltados para a proteção social e ao enfrentamento das desigualdades. A organização dos trabalhadores se apresenta como uma estratégia para a construção de uma política pública mais efetiva e adequada às necessidades da população usuária.

O artigo 5º da LOAS instituiu um modelo de gestão democrático, descentralizado e participativo para execução da Política de Assistência Social, devendo-se observar, além da descentralização e da primazia da responsabilidade do Estado, a “participação da população, por meio de organizações representativas, na formulação das políticas e no controle das ações em todos os níveis”. Isso permitiu que a sociedade civil ocupasse espaços de decisão, com poder para influenciar a agenda estatal, definir prioridades e capacitar essa política com ferramentas para avaliar ações governamentais em todas as esferas.

Em consonância com essa diretriz, os Conselhos e as Conferências de Assistência Social surgem como instâncias deliberativas do SUAS, que se encontram institucionalmente organizadas em todo o território nacional. Esses espaços formais representam ambientes de negociação entre o governo e a sociedade civil, contribuindo para moldar a Política Nacional de Assistência Social (PNAS) e precisam ser ocupados de modo a permitir o diálogo muitas vezes permeado por contradições históricas, como as que alicerçam o papel do Estado e da sociedade civil. No entanto, nesta relação é preciso ser mantida a direção ética e política que constrói o fortalecimento das políticas sociais em favor das classes subalternas. Em 2004, a relevância da participação foi reiterada no texto da PNAS, com a adição dos Fóruns como mecanismos de articulação na sociedade.

Vale ressaltar a importância dos fóruns de participação popular, específicos e, ou, de articulação da política em todos os níveis de governo, bem como a união dos conselhos e, ou, congêneres no fortalecimento da sociedade civil organizada na consolidação da Política Nacional de Assistência Social (Brasil, 2004, p. 47).

Como dito, o movimento dos trabalhadores do SUAS é histórico, ocorre desde o engajamento nos espaços de luta sindical e em instâncias de exercício do controle social como os Conselhos e as Conferências de Assistência Social. No entanto, nos últimos tempos, estes vêm constituindo seus próprios espaços de luta por meio de Fóruns permanentes, conforme exposto por Berwig (2018, p. 136):

Além da vinculação em diferentes entidades sindicais, conselhos profissionais, associações e grupos profissionais, os trabalhadores do SUAS vêm construindo seu próprio espaço de luta mediante a instituição de fóruns permanentes.

 

Leia também:A sociedade civil nos conselhos de assitência social  

software para CRAS CREAS - GESUAS


A organização do Fórum Nacional de Trabalhadoras e Trabalhadores do SUAS

A criação do Fórum Nacional de Trabalhadoras e Trabalhadores do SUAS (FNTSUAS) ganhou destaque como desdobramento do processo de organização coletiva desses trabalhadores. A primeira coordenação nacional do FNTSUAS foi formalizada em julho de 2011, após movimento iniciado durante a VII Conferência Nacional de Assistência Social em dezembro de 2009, quando os trabalhadores foram mobilizados para organização de Fóruns estaduais, regionais e municipais.

De acordo com seu Regimento Interno, o FNTSUAS:

[…] é um espaço coletivo de organização política de trabalhadoras(es) do Sistema Único de Assistência Social (SUAS), de nível escolar fundamental, médio ou superior, atuantes na Política de Assistência Social na rede socioassistencial pública ou privada e vinculadas(os) a entidades e associações representativas de diversas formas (FNTSUAS, 2018, p. 1).

A finalidade precípua dos Fóruns, enquanto espaço de organização coletiva, segundo Berwig (2018, p.154), “é fomentar a articulação política, deliberar, pactuar, participar do controle social através da representação de cada segmento”. A organização do FNTSUAS ocorre por meio da articulação de diversas instâncias organizativas como os conselhos de classe, sindicatos e associações de profissionais da área.

O FNTSUAS se apresenta como espaço de expressão e deliberação das demandas dos trabalhadores da Assistência Social, estabelecendo, entre suas metas de ação, a realização de seminários para aproximar os trabalhadores, fomentar discussões e organizar estratégias que subsidiem a sustentação da Política Nacional de Assistência Social. Sua atuação abrange tanto a dimensão da formação quanto a dimensão política, por meio de manifestos e notas de posicionamento que reforçam a importância da democracia e da participação na defesa dos direitos e da qualidade dos serviços socioassistenciais.

ACESSE O BLOG DO FNTSUAS

Através dos Fóruns de Trabalhadores e Trabalhadoras do SUAS,  os trabalhadores compartilham experiências, trocam conhecimentos, propõem ações coletivas e participam das discussões e do processo de formulação de políticas no campo da Assistência Social.

Entre as questões discutidas no âmbito do FNTSUAS estão as relacionadas ao trabalho e às condições de trabalho, assim como à identidade, representação e representatividade do trabalhador do SUAS e seu papel na efetivação da Política de Assistência Social, incluindo-se a participação nos espaços de controle social.

Nos debates realizados no âmbito do FNTSUAS, a construção de estratégias políticas para efetivação da Política de Assistência Social perpassa pelo reconhecimento da particularidade das diferentes profissões; pelas diferentes experiências de articulação do trabalho profissional no âmbito da proteção social; pela importância do trabalho multiprofissional no SUAS, bem como sua contribuição para o fortalecimento da gestão do trabalho a partir da problematização da realidade social e da natureza da intervenção das diferentes profissões definidas na Resolução CNAS nº 17/2011. Ademais, temas como princípios éticos e educação permanente também são discutidos, fortalecendo o compromisso daqueles que atuam no SUAS. Esses eventos não apenas capacitam os trabalhadores, mas também os habilitam a enfrentar os desafios que surgem no cenário político, fortalecendo o diálogo coletivo em torno das questões que permeiam a realidade dos trabalhadores e a efetivação do SUAS.

No movimento de organização do FNTSUAS foi priorizada a constituição de Fóruns Estaduais de Trabalhadores do SUAS por todo o país, como estratégia de fortalecimento da ação coletiva e ampliação da agenda de luta. Entre os objetivos destes fóruns, destaca-se o de “[…] Articular e mobilizar os/as trabalhadoras/es na defesa do Sistema Único de Assistência Social – SUAS enquanto política não contributiva” (FNTSUAS, 2018, p. 2).

CONHEÇA ALGUNS DOS FÓRUNS ESTADUAIS, REGIONAIS E MUNICIPAIS ESPALHADOS PELO BRASIL:

FETSUAS – MT
FETSUAS – SP
FETSUAS – SC
FETSUAS – RS
FETSUAS – PE
FETSUAS – AM
FETSUAS – MT
FETSUAS – BA
FMT SUAS – São José do Rio Preto

Diante do cenário sempre desafiador colocado para as políticas públicas em especial para a de Assistência Social, os Fóruns de Trabalhadoras e Trabalhadores do SUAS desempenham papel de suma importância, pois não apenas são cruciais na busca por soluções coletivas, como também atuam enquanto agentes catalisadores da conscientização, impulsionando a busca por melhorias. Essas melhorias referem-se não apenas aos processos de mobilização e articulação dos trabalhadores, mas também à efetiva incorporação das demandas dos usuários na agenda de luta, à superação de obstáculos estruturais e à consolidação de espaços democráticos de participação.

CONCLUSÃO

É possível considerar que a organização das resistências dos trabalhadores do SUAS avançou politicamente, ganhando força a partir da atuação dos Fóruns, uma vez que estes avançam enquanto criação de espaços de diálogo, capacitação e troca de experiências, nos quais os profissionais do SUAS encontram suporte para enfrentar os desafios cotidianos.

Assim, os  Fóruns de Trabalhadores e Trabalhadoras do SUAS desempenham um papel fundamental ao se configurarem como movimento de resistência da classe trabalhadora, proporcionando coesão e voz coletiva em meio a um contexto de contrarreformas. Tais espaços precisam ser fortalecidos e ampliados no sentido de se tornarem ambiente favorecedor da ampliação da consciência coletiva dos trabalhadores do SUAS.

Por fim, é importante destacar que os Fóruns de Trabalhadoras e Trabalhadores do SUAS enfrentam desafios consideráveis, dentre eles a necessidade da articulação de base para avançar com a instituição de novos Fóruns e o fortalecimento dos já existentes.

 

REFERÊNCIAS

BERWIG, Solange Emilene. Os trabalhadores do SUAS: Regulação e resistência em tempos de reforma do Estado brasileiro. Tese de Doutorado em Serviço Social, Pontifícia Universidade Católica do Rio Grande do Sul (PUCRS), Rio Grande do Sul, 2018. 216 f.

BRASIL. Lei nº. 8.742, de 7 de dezembro de 1993. Lei Orgânica da Assistência Social (LOAS). Presidência da República, Brasília, 1993.

BRASIL. Resolução nº 145, de 15 de outubro de 2004. Política Nacional de Assistência Social – PNAS. Diário Oficial da União de 28 de outubro. Ministério do Desenvolvimento Social e Combate à Fome. Brasília, 2004.

FNTSUAS. Regimento Interno do Fórum Nacional de Trabalhadoras/es do Sistema Único de Assistência Social – SUAS (2018). Disponível em: https://drive.google.com/file/d/0B6-e-JPRfM5VNVp3SnZxTTFrMjA/edit?resourcekey=0–Xi9EKsVvLyq-EQK_Sj6Fw. Acesso em: março de 2023.

MARTINS, Gisele Rodrigues. ORGANIZAÇÃO, LUTA E RESISTÊNCIA: a atuação dos Fóruns de Trabalhadores e Trabalhadoras do SUAS no estado de Mato Grosso / Gisele Rodrigues Martins. — Dados eletrônicos (1 arquivo: 142 f., il. color., pdf). — 2023.

Comentários

Deixe um comentário

O seu endereço de e-mail não será publicado. Campos obrigatórios são marcados com *