O que se deve considerar para a implantação de uma unidade ou um serviço de Alta Complexidade?

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Por Débora Begati

O Sistema Único de Assistência Social – SUAS se organiza por serviços que integram os níveis de proteção social da Assistência Social, com vistas a responder de forma complementar as mais variadas formas de vulnerabilidade social e risco vivenciadas pela população. Desta forma têm-se dois níveis, que atualmente orientam de forma normativa, como estados e municípios irão organizar a oferta destes serviços.

Níveis de proteção no SUAS

O primeiro nível de proteção refere-se à Proteção Social Básica, que tem como objetivo prevenir situações de risco por meio do desenvolvimento de potencialidades e aquisições, e o fortalecimento de vínculos familiares e comunitários. A unidade de referência para oferta dos serviços é o Centro de Referência de Assistência Social – CRAS. Os serviços da PSB são:

  • Proteção e Atendimento Integral à Família (PAIF);
  • Serviço de Convivência e Fortalecimento de Vínculos (SCFV);
  • Proteção Social Básica no Domicílio para Pessoas com Deficiência e Idosas.

O segundo nível trata-se da Proteção Social Especial que tem como foco o atendimento à famílias e indivíduos que se encontram em situação de risco pessoal e social, por ocorrência de abandono, maus tratos físicos e, ou, psíquicos, abuso sexual, uso de substâncias psicoativas, cumprimento de medidas sócio-educativas, situação de rua, situação de trabalho infantil, entre outras. Esse nível de proteção se subdivide em dois níveis de complexidade.

Tem-se a média complexidade destinada às famílias e indivíduos com seus direitos violados, mas cujos vínculos familiares e comunitário não foram rompidos. As unidades de referência para oferta destes serviços são o Centro de Referência Especializado de Assistência Social – CREAS e o Centro de Referência Especializado para População em situação de Rua – Centro POP. E a alta complexidade, que se refere as situações que, em decorrência da violação de direitos, os vínculos foram rompidos. Tem-se como unidades de referências para execução dos serviços as unidades de acolhimento.

Os Serviços de Média complexidade são:

  • Serviço de Proteção e Atendimento Especializado a Famílias Indivíduos (PAEFI);
  • Serviço Especializado em Abordagem Social;
  • Serviço de proteção social a adolescentes em cumprimento de medida socioeducativa de Liberdade Assistida (LA) e de Prestação de Serviços à Comunidade (PSC);
  • Serviço de Proteção Social Especial para Pessoas com Deficiência, Idosas e suas Famílias;
  • Serviço Especializado para Pessoas em Situação de Rua.

Os serviços de Alta Complexidade são:

  • Serviço De Acolhimento Institucional;
  • Serviço De Acolhimento Em Repúblicas;
  • Serviço De Acolhimento Em Família Acolhedora;
  • Serviço De Proteção Em Situações De Calamidades Públicas E De Emergências;

Saiba mais: Tipificação Nacional de Serviços Socioassistenciais

Organização e implantação de serviços no SUAS

A oferta dos serviços do SUAS estão desenhadas em suas normativas trazendo de forma prática a composição das equipes, formas de identificação das situações e metodologias de trabalho que possibilitem alcance dos objetivos de cada serviço. A execução é prevista de forma integrada visto que a atenção ofertada em cada nível de proteção e complexidade rebate sobre todo o sistema de serviços. Ou seja, a qualidade, organização da oferta dos serviços em cada nível coopera para que não se agravem as situações existentes. A metodologia almejada ao desenhar esse sistema foi o de cooperação, articulação e complementaridade das ações.

A PSE, por exemplo, é uma resposta de proteção ás formas de agravamento das vulnerabilidades existentes e que não foram possíveis serem superadas ou prevenidas no âmbito dos serviços da PSB. Importante destacar que esse fenômeno não se deve, apenas, pela insuficiência ou incapacidade de outro nível de proteção, mas desse fator organizacional e toda uma conjuntura social, histórica que está como pano de fundo a este contexto.

Desta forma, levando em consideração estes aspectos, é preciso que os serviços sejam desenhados de forma estratégica e racionalmente pensadas. A implantação de qualquer serviço, ou mesmo sua organização, precisa ter traçado: justificativas, reflexões sobre os impactos sociais buscados, dados e estatísticas que auxiliam a ter de forma precisa o planejamento deste serviço.

Na PSE, assim como os demais níveis, isso é imprescindível. Organizar os serviços justificando-os e situando-os de forma estratégica dentro do território fará muita diferença nos resultados. “É o começar as coisas do jeito certo e não da forma errada”. Portanto a pergunta: o que se deve considerar para a implantação de uma unidade ou um serviço de alta complexidade? É uma forma de reflexão inicial afim de conter os argumentos que precisamos para conduzir um bom planejamento e estratégias de implantação desta modalidade de serviços.

Serviço de Alta Complexidade no SUAS

Um fator importante refletir, é que a espera e expectativa sobre a implantação desse serviço resolverá o aglutinado de demandas que a cada dia se complexificam mais no âmbito da Assistência Social. Vê-se um grande aumento de relatos quanto a requisição por parte da rede de serviços, população e operadores do SUAS para  implantação e ampliação dos serviços de alta complexidade.

Os dados demonstram que instituições de idosos por exemplo, estão sendo insuficientes a cada ano diante da demanda que está aumentado. Mas temos um cenário muito parecido quando se trata de pessoas com deficiência, crianças e adolescentes. Mas para olhar esse fenômeno o olhar não pode ser focalizado em uma única forma de resolução da questão.

O SUAS traz em sua matriz a perspectiva de assegurar o convívio familiar e comunitário como forma de proteção social e meio para superação de formas de vulnerabilidade e violação de direitos. O mecanismo utilizado é uma rede de serviços fortalecida, em todos seus níveis de proteção. Portanto pensar que um serviço de acolhimento é a medida que soluciona o emaranhado de demandas existentes, é pensar de forma superficial, isso trará um fôlego pontual, mas não intervém na raiz da questão.

Desta forma, é importante sempre ao falar de serviços de alta complexidade, avaliar a fundo a rede de serviços e como está sendo operacionalizada. Como os fatores cooperação e articulação estão e quais os impactos nas demandas. Esse processo dará grandes ferramentas à gestão para pensar se de fato a melhor saída é a implantação desse serviço e, se for, como essa demanda pode ser amenizada atuando na raíz desse fenômeno naquela localidade.

Leia também: A Precariedade dos serviços da PSB e seus impactos no Atendimento Especializado no SUAS

Oferta dos serviços de Alta Complexidade no SUAS

Bem, para que se possa compreender o que se deve considerar para a implantação de uma unidade ou um serviço de alta complexidade, é preciso situar que os serviços de alta complexidade estão no maior nível de proteção e como o próprio nome já indica, refere-se a algo com alta complexidade.

Isso pois, é a órbita de serviço em que o estado assume as primícias naturais de contexto de vida das pessoas, os cuidados e proteção integral. Diz de uma alteração nos modos de vida de forma temporária ou de longa permanência e traz à tona histórias e contextos marcados por uma extrema situação de violência.

A exigência quanto a qualidade e oferta destes serviços é inegável. Afinal a história conta que sempre foram marcados por cenários de desqualificação e continuidade de violação por meio institucional. Desta forma o SUAS e os atores do sistema de garantia de direitos regulam de forma precisa, ao menos deve ser assim, a forma com que se estrutura, operacionaliza a oferta destes serviços. Eles precisam estar, como mencionado anteriormente, sobre o teto da legalidade normativa e alinhado com metodologias capazes de êxito quanto aos impactos sociais esperados.

A alta complexidade no SUAS, precisa estar em consonância com as formas reais de proteção social na perspectiva dos direitos, garantindo que os princípios de diretrizes do SUAS estejam sendo norteadores das ações do cotidiano profissional. Situar este serviço como meio de proteção às formas de desproteção e não a outros objetivos que desvirtuem essa lógica.

Leia também: A Proteção Social Especial e as situações de violência e violação de direitos

 

Modelo de Formulário de Encaminhamento para CRAS, CREAS e SUAS em geral para download

O que se deve considerar para a implantação de uma unidade ou um serviço de alta complexidade?

Diante do exposto, o que se deve considerar para a implantação de uma unidade ou um serviço de alta complexidade é a observância de aspectos de duas ordens: a primeira ordem diz respeito a estruturação e desenho da oferta de atenção e o segundo refere-se aos aspectos operacionais. Ambas, estão basiladas na perspectiva legal e normativa sobre este segmento de serviços.

O primeiro ponto, denota a necessidade de compreender como se chegou à necessidade de oferta daquele serviço naquela localidade. Portanto é importante ter estudos preliminares a partir de dados produzidos na rede socioassistencial e intersetorial sobre determinado segmento e as formas de desproteção social. E diante disso qual a resposta que melhor vai atender a essa demanda.

Análises diagnósticas com auxilio de ferramentas de gestão e vigilância que darão norte de qual, como e onde o serviço precisa estar. Desta forma visando atingir as seguranças do SUAS direciona-se os serviços da forma correta. Têm-se otimização dos recursos que serão necessários, os impactos sociais serão melhor atingidos. Não é incomum perceber que alguns serviços são implantados em detrimentos de outros e ao se analisar a prática não condiz com a necessidade daquele local. É preciso análise estratégica de população, território e inclusive projeção a partir de dados de cenários futuros com base no que se tem hoje.

O segundo ponto, refere-se à adequação e garantia em termos operacionais e burocráticos da oferta de serviços. Levar em consideração as normativas que indicam com base em experiências como devem ser estruturados os recursos e como devem ser dispostos. Garantir recursos humanos, físicos, financeiros e pactuar formas de sustentabilidade da qualidade da oferta.

Os serviços de alta complexidade em si já denotam um grau elevado de desproteção e mitigação dos direitos, mas podem ser atenuados com uma oferta qualificada que atende de forma digna e na perspectiva real da garantia dos direitos às pessoas, de forma a contemplar todos os aspectos que envolvem a vida humana e sua diversidade. Portanto equipes que recebam o aparato necessário para implementar as metodologias de atendimento compatíveis com a lógica pretendida.

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Conclusão

Falar sobre o que se deve considerar para a implantação de uma unidade ou um serviço de alta complexidade, é pensar que toda ação de construção, reconstrução de serviços no SUAS precisa se aproximar cada vez mais de métodos de profissionalização e abandonar meios baseados em achismos e nenhuma estratégica.

Os princípios e eixos que estruturam o SUAS precisam fazer parte da condução racional destes meios de implantação, avaliação e monitoramento dos serviços. Os dados e análises reflexivas baseada em evidências precisam ser o norte para a gestão e equipes na estratégica de proteção social às formas de desproteção.

A implantação de qualquer serviço precisa levar em consideração aspectos reais de compromisso com qualidade na oferta, garantia integral dos direitos humanos e profissionalização das formas de intervenção face as situações que são apresentadas no cotidiano.

 

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