Alternativas de Captação de Recursos para o SUAS: editais, parcerias e fundos municipais em ação.

Tempo de leitura: 7 minutos

Por Aline Barreto

A garantia da oferta contínua e qualificada dos serviços, benefícios e programas socioassistenciais previstos no Sistema Único de Assistência Social (SUAS) depende essencialmente da sustentabilidade financeira. Embora o cofinanciamento tripartite (União, Estados e Municípios) seja a espinha dorsal do sistema, a instabilidade dos repasses e a crescente demanda tornam imperativo que os gestores municipais busquem alternativas complementares de captação de recursos. Dominar estratégias como editais, parcerias e a potencialização dos fundos municipais é essencial para a inovação, a ampliação da cobertura e a consolidação da rede de proteção social no território.

A dependência do cofinanciamento e a necessidade de complementaridade

A Norma Operacional Básica do SUAS (NOB/SUAS) estabelece as responsabilidades de cada ente federado. No entanto, os municípios, principal porta de entrada do sistema, frequentemente enfrentam:

  • Atraso ou irregularidade nos repasses dos entes superiores;
  • Insuficiência de recursos para cobrir todas as demandas identificadas no território;
  • Dificuldade em garantir a contrapartida financeira exigida;
  • Necessidade de financiar projetos inovadores não totalmente cobertos pelas fontes tradicionais.

Nesse contexto, a busca por recursos extras não é uma opção, mas uma estratégia de gestão necessária para assegurar a efetividade da política pública e a garantia de direitos.

Editais de Fomento e Chamamento Público: oportunidade para inovar e fortalecer projetos

Editais são instrumentos convocatórios publicados por entes públicos ou privados (como fundações e empresas) para selecionar e financiar projetos específicos. São uma das principais alternativas para captação de recursos externos.

Fontes: Podem ser lançados por ministérios (MDSA, Saúde, Cultura), governos estaduais, fundações (BB, Itaú Social, Fundação Tide Setubal, etc.), e até por consórcios intermunicipais.

Vantagens:

  • Permitem acessar recursos não onerosos (não precisam ser devolvidos);
  • Financiam projetos inovadores e pontuais que complementam os serviços de rotina (ex.: oficinas de geração de renda, projetos de esporte e cultura para jovens, capacitação de conselheiros);
  • Fortalecem a capacidade técnica da equipe na elaboração de projetos.

Desafios e Estratégias:

  • Alta competitividade: exige que o projeto seja muito bem elaborado, com clareza de objetivos, metas, cronograma e orçamento realista;
  • Adequação ao edital: o projeto deve se alinhar perfeitamente às diretrizes e ao foco temático do edital;
  • Prestação de contas específica: exige um rigoroso controle da aplicação dos recursos, conforme previsto no projeto aprovado.

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É possível estabelecer parcerias com Organizações da Sociedade Civil (OSCs) e de Iniciativa Privada?

As parcerias são arranjos colaborativos que podem assumir diversas formas, indo além do repasse financeiro.

  • Parcerias com OSCs (via chamamento público): O município pode, por meio de edital, selecionar OSCs para executar serviços socioassistenciais que complementem a rede, como abrigos, serviços de acolhimento ou atividades especializadas. O recurso para isso geralmente vem do próprio orçamento do SUAS municipal, mas a parceria otimiza a execução;
  • Termos de Colaboração e Cooperação: Acordos com outras secretarias municipais (Saúde, Educação, Esporte) para desenvolvimento de ações conjuntas, compartilhamento de espaços físicos e recursos humanos, potencializando o orçamento de todas as pastas.
  • Parcerias com a Iniciativa Privada (via Lei de Incentivo ou ISR):

Leis de Incentivo Fiscal (como o Fundo da Criança e do Adolescente – FIA e o Fundo do Idoso): Empresas e pessoas físicas podem destinar parte do Imposto de Renda devido para projetos aprovados nesses fundos. É um mecanismo poderoso e subutilizado;
Investimento Social Privado (ISP): Empresas podem investir diretamente em projetos sociais, sem o viés fiscal, por meio de suas áreas de responsabilidade social. A chave é apresentar um projeto alinhado à estratégia da empresa;
Doações e Campanhas: Campanhas pontuais para arrecadação de recursos, alimentos, materiais ou roupas, mobilizando a comunidade.

Leia também: A utilização dos recursos do bloco de financiamento da PSE para assegurar seguranças no SUAS

Fundos Muncipais de Assistência Social: é possível potencializar o recurso próprio?

O Fundo Municipal de Assistência Social é um instrumento fundamental e obrigatório, mas muitas vezes subaproveitado. Ele não é uma “alternativa” no sentido estrito, mas a principal ferramenta legal para gerir e potencializar todos os recursos do SUAS no município.

Função: É uma conta especial, gerida pelo Conselho de Assistência Social, para onde devem ser canalizados todos os recursos da assistência social, sejam eles do cofinanciamento, da própria prefeitura, de doações ou de parcerias;

Como potencializar a captação via Fundo:

  • Alocação de Recursos Próprios: Garantir que a dotação orçamentária do município para a assistência social seja efetivamente depositada no Fundo;
  • Captação via Incentivo Fiscal: Como mencionado, divulgar massivamente a possibilidade de destinação de Imposto de Renda para o Fundo Municipal da Criança e do Adolescente (FMCA) e para o Fundo do Idoso, que podem financiar projetos do SUAS;
  • Receitas Eventuais: Direcionar para o Fundo doações em dinheiro, multas, ou quaisquer outras receitas eventuais previstas em lei municipal;
  • Transparência e Credibilidade: Um Fundo bem gerido, com prestação de contas transparente e ágil, atrai mais parceiros e doadores, pois gera confiança na aplicação dos recursos.

    Leia também: Usando a Gestão da Informação para garantir recursos para a Assistência Social

A Governança como fator de sucesso

O sucesso na captação de recursos depende menos de sorte e mais de gestão. É necessário:

  • Capacitação Técnica: Formar equipes capacitadas em elaborar projetos, prestar contas e gerir convênios.
  • Planejamento Estratégico: Identificar as necessidades do território e elaborar um “portfólio” de projetos prontos para serem submetidos a oportunidades;
  • Articulação Interinstitucional: Manter diálogo constante com conselhos, OSCs, empresas e outras secretarias;
  • Transparência: Adotar sistemas de controle e prestação de contas robustos, como o SIGCON-SAÍDA, para garantir a credibilidade perante financiadores e sociedade.

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Conclusão

A busca por alternativas de captação de recursos para o SUAS é um imperativo da gestão contemporânea. Editais, parcerias estratégicas e o pleno aproveitamento dos fundos municipais não substituem a obrigação do Estado com o financiamento adequado da política, mas funcionam como mecanismos cruciais de complementaridade e inovação.

A gestão competente e transparente desses instrumentos permite aos municípios ampliar o escopo e a qualidade dos serviços oferecidos, reduzindo a dependência de fontes únicas de recurso e, principalmente, fortalecendo a rede de proteção social para que ela seja, de fato, universal e capaz de garantir direitos à população em situação de vulnerabilidade. 

Bibliografia

BRASIL. Ministério da Cidadania. Norma Operacional Básica do SUAS – NOB/SUAS. Brasília, 2012. (Estabelece as diretrizes para a gestão do financiamento no SUAS).

BRASIL. Lei nº 12.101, de 27 de novembro de 2009. Dispõe sobre a certificação das entidades beneficentes de assistência social e regulamenta a isenção de contribuições para a seguridade social.

BRASIL. Lei nº 12.868, de 15 de outubro de 2013. Altera a Lei nº 12.101/2009 para facilitar a destinação de recursos aos Fundos dos Direitos da Criança e do Adolescente.

IPEA – Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada. Financiamento da Política de Assistência Social: evolução e desafios. Brasília: Boletim Legislativo n° 42, 2017.

MONTANARI, P. M.; RAICHELIS, R. Gestão Social: articulação de políticas e captação de recursos. São Paulo: Editora Cortez, 2015.

SANTOS, R. M. dos; PAULA, A. P. P. de. Gestão Financeira e Orçamentária no SUAS: os desafios para a efetivação da política pública. In: Revista Políticas Sociais: acompanhamento e análise, n° 26, Ipea, 2020.

Conselho Nacional de Assistência Social (CNAS). Resolução nº 182/2025

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